Na minha história de amor, cada um ficou do seu lado da fronteira sem poder ultrapassar até que acabe a pandemia. Eu no Brasil, meu companheiro no Chile.
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Dizem que o amor ultrapassa fronteiras. E costumava ser verdade, até que chegou o coronavírus.
Eu sou brasileira, o Max é chileno e nos conhecemos por acaso. Eu estava viajando pelo Chile e ele aproveitou um feriado para sair de Santiago, onde morava, para o Deserto do Atacama. Por acaso tomamos o mesmo tour. Por acaso a van quebrou e tivemos muito tempo para conversar. Pouco tempo depois eu estava me mudando para o Chile para morar com ele. Passamos um ano e três meses por lá e viemos juntos para o Brasil.
Essa história teve uma interrupção inesperada: por acaso surgiu um vírus na China, que em poucos meses se tornou uma pandemia, um terço da população mundial ficou isolada em suas casas, as fronteiras foram fechadas e um casal ficou separado por acaso, cada um no seu país, esperando o isolamento acabar.
Se eu sugerisse esse texto para a editora da Worldpackers em 2019 ela certamente diria não, com o argumento de que, além de piegas, era um enredo sem pé nem cabeça que nunca iria acontecer.
Em 2020, aconteceu comigo. E todo mundo tem uma história, melhor ou pior, para contar sobre a sua vida nos tempos de coronavírus.
No início de março, quando o vírus ainda era algo que não assustava, o Max tinha ido a Santiago resolver algumas coisas. Dez dias depois o Chile fechou fronteiras para estrangeiros, as companhias aéreas do país suspenderam os voos e, mais tardiamente, o Brasil fechou as fronteiras.
Ficamos ele lá e eu aqui. Até quando? Ninguém sabe.
No momento em que eu escrevo esse texto faz um mês e meio que estamos separados e já se vão três semanas de isolamento em São Paulo, onde eu moro. Eu e outras pessoas ao redor do mundo mudamos a maneira de fazer as coisas: a rotina de trabalho, de amizades, de lazer e, no meu caso, de amar também.
E nos tempos de corona, amar não é só estar junto fisicamente, é estar presente do jeito que dá. Amor nos tempos de corona é entender que uma relação é compartilhar uma vida e não necessariamente estar no mesmo ambiente.
A internet nos possibilita rir juntos, chorar, contar como foi o nosso dia e vamos levando a vida, sem saber ainda quando nos encontraremos novamente. Cada dia que passa estamos mais perto do dia que tudo isso vai acabar, embora ainda não saibamos que dia é esse.
Hoje a principal preocupação é que as coisas importantes da nossa vida resistam à pandemia: que o emprego não seja perdido, que não falte comida, que o dinheiro seja suficiente e até mesmo que a gente e nossos familiares sobrevivam.
Eu me considero uma pessoa de sorte em ter uma casa, comida, saúde e poder me preocupar com que a minha história de amor chegue viva ao fim da pandemia. E com mais sorte ainda por saber que isso em algum momento vai passar e vamos voltar aos tempos em que o amor ultrapassava fronteiras.
Eu e o Max vamos nos encontrar de novo, essa fase vai ser apenas uma lembrança e daqui a alguns anos vou contar essa história em mesas de bar, divertindo meus amigos com os “causos” de um amor nos tempos do corona.